Introdução

Por que devemos nos preocupar com o marxismo? Por que inclui-lo entre os grupos religiosos e ideológicos que precisam ser alcançados pelo Evangelho? Há fatos que nos obrigam a isto, e nos impulsionam a ver o marxismo como um grupo fechado, com suas crenças e cosmovisão próprias, necessitando de uma atenção especial no tocante ao evangelismo.

Atualmente, os países muçulmanos são o maior grupo de perseguição aos cristãos. No ranking criado pela organização missionária Portas Abertas, quase 90% dos cinquenta países listados são muçulmanos. Estes estão presentes em todos os níveis de perseguição, desde a mais severa até problemas ocasionais com a Igreja.

Entretanto, o primeiro lugar no ranking não pertence a um país muçulmano; pertence à Coreia do Norte, um país governado pela ideologia marxista, cuja nota conferida por Portas Abertas é de 82 pontos contra 68,5 do segundo colocado, a Arábia Saudita – uma diferença considerável. Ao lembrarmos que a Coreia do Norte já foi testemunha de um grande avivamento, chegando Pyongyang, sua capital, a possuir 13% de cristãos, nos perguntamos: o que aconteceu?

Podemos entender a oposição muçulmana-cristã por tratar-se de duas religiões conflitantes em seus fundamentos, com uma inimizade histórica que vai desde os seus primórdios. Mas como entender o motivo pelo qual o cristianismo é perseguido de uma forma tão perversa, intensa e diabólica, justamente nos países onde o marxismo foi adotado como ideologia? Como explicar que um homem educado com raízes judaicas e protestantes pudesse criar uma ideologia tão inimiga do cristianismo? O que disse ou escreveu Karl Marx que resultou em mais de 70 anos de perseguição serrada à Igreja, perseguição esta que persiste até os dias de hoje?

Vivemos na Era pós-Guerra Fria, e a geração atual nasceu depois da queda do Muro de Berlim. Os milhões de cristãos mortos são assunto do passado. Em alguns dos países onde o sangue deles foi derramado, os cristãos ainda desfrutam de certa liberdade. O fato é que o ser humano tem memória curta e a tendência é esquecermos o que aconteceu.

Todavia, a pergunta permanece: por que os comunistas foram tão cruéis com os cristãos? O que havia em sua ideologia que não apenas permitiu, mas motivou a prisão, a tortura e a morte de milhares de cristãos? Por que os comunistas se tornaram escarnecedores de tudo o que era sagrado? A resposta a estas perguntas justificará nossa análise da ideologia marxista.

Em 1974, aconteceu em Lausana (em francês Lausanne), na Suíça, a grande reunião conhecida como Comissão Lausanne para Evangelização Mundial (LCWE). Na década de 1980, foi lançada uma série de livros que buscava orientar de forma prática o objetivo de Lausanne, que era a finalização da Grande Comissão, a evangelização mundial de acordo com os termos bíblicos. Dentre os livros produzidos por esta série, estava O Evangelho e o marxista, escrito com a finalidade de abordar as concepções marxistas de mundo e de demonstrar como alcançar este grupo com a mensagem da salvação. Eles entendiam que marxismo é muito mais que um segmento político, trata-se de uma ideologia quase religiosa que, justamente por isso, se opõe agressivamente ao cristianismo e continua apresentando, de certo modo, grande resistência ao Evangelho. Embora com características diferentes, o marxismo continua presente na cultura de muitas nações, inclusive de boa parte do Ocidente; e em muitos casos, é mais do que cultural.

O que nos interessa no marxismo? Não é definitivamente o marxismo político que nos importa aqui, mas o marxismo como ideologia, com seus conceitos sobre o homem, o mundo, o futuro e sobre Deus. Em algum momento, estes conceitos podem nos obrigar a analisar politicamente uma situação. Entretanto, nosso propósito é analisar o marxismo à luz do cristianismo, seus efeitos sobre a mente das pessoas, e pensar sobre como levar o Evangelho a tais grupos ou pessoas sob esta influência. Quem conhece o marxismo profundamente sabe que não é questão de um mero partido político ou de uma doutrina econômica, mas trata-se de uma cosmovisão que influencia toda uma maneira de ver a vida. Primeiramente, não queremos falar dos aspectos econômicos ou políticos da doutrina de Marx, mas apenas analisar os pontos que levaram os países que adotaram sua ideologia a perseguir, torturar e odiar os cristãos.

Somos cristãos e temos por base as Escrituras Sagradas como revelação única e infalível dos propósitos de Deus. As Escrituras são o crivo e o prumo com os quais medimos qualquer afirmação, principalmente as que se propõem a responder questões vitais, como aquelas com as quais o marxismo lida. Queremos expor um pouco de Marx e sua doutrina, analisando sua obra à luz da Palavra de Deus.

Para efeitos de compreensão, usaremos os termos “marxismo”, “comunismo” e “socialismo” como intercambiáveis, reconhecendo que em uma literatura política podem apresentar nuances que os diferenciem.

Outra questão que surge quando vamos lidar com o assunto é: o comunismo (ou socialismo, ou marxismo) não caiu com a União Soviética e o Muro de Berlim? Na verdade, o que caiu foram sistemas políticos baseados nesta ideologia, enquanto a ideologia em si mesma permaneceu em pé gerando outros sistemas políticos. Além disso, alguns países como Coreia do Norte, Cuba e China permaneceram firmemente socialistas.

A verdade é que o marxismo tem o vigor de uma religião e, por isso, ainda possui adeptos em várias camadas da sociedade, de humildes camponeses a intelectuais acadêmicos, de operários a estadistas. Assim como os que acreditam nas teorias da reencarnação e carma não precisam estar ligados a alguma religião, os que acreditam nas ideias marxistas não precisam estar em um partido político comunista ou afim.

O marxismo é o que se pode chamar de uma cosmovisão, um sistema que procura explicar totalmente a existência à sua volta, dando-lhe um sentido racional. A cosmovisão do marxismo, em diversos pontos, entra em choque direto com as Escrituras Sagradas, enquanto reclama sua autoridade sobre supostas “leis de História” e exige uma aceitação incondicional de seu credo.

Por causa disto, não se pode dizer que o marxismo está morto. Suas ideias ainda são centrais em muitos partidos políticos e no mundo acadêmico. Sem dúvida alguma, Marx é citado em discussões e debates sobre diversos temas. Basta pesquisar na internet e verificar a sigla de boa parte dos partidos políticos da América Latina e de outros lugares do mundo, basta principalmente conhecer os currículos acadêmicos (principalmente na área de humanas), nos quais o marxismo está vivo e ativo.

Embora alguns, como Alister McGrath, acreditem que “o marxismo sobrevive nas universidades, lar frequente das causas perdidas”, a verdade é que as universidades são justamente os principais instrumentos para formação do pensamento de um povo. E, se o marxismo está nas universidades, então está no mundo como um todo.

Dessa forma, nós, cristãos, frequentemente teremos de lidar com pessoas cuja formação intelectual foi edificada a partir do marxismo. Nas conversas corriqueiras, poderemos perceber uma forte crítica ao cristianismo, elemento essencial do marxismo, e seremos desafiados a dar testemunho sobre isso.

“O socialismo acabou” – é o que muitos vão dizer. Ele teria sido sepultado sob os escombros do Muro de Berlim. Mas, se isto é verdade, por que existem tantos “partidos socialistas”? Por que os estudantes são bombardeados pelo marxismo, enquanto tantos professores interpretam a história e o mundo segundo a cosmovisão marxista? Por que as razões reais do fracasso socialista não são estudadas a fundo e apresentadas à nova geração? Uma ideologia não morre tão fácil assim, muito menos uma ideologia tão destruidora como esta. Ao contrário, fica impregnada na humanidade e, embora possa metamorfosear-se sempre que necessário, não se torna por isso mais fraca ou menos perigosa.

Nosso desafio é entender o marxismo e confrontar os que nele confiam como fonte de verdade e redenção, conduzindo-os à redenção que só existe em Cristo Jesus e em nenhum outro.