Introdução

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“Esta é uma palavra fiel: se alguém deseja o episcopado, excelente obra deseja. Convém, pois, que o bispo seja irrepreensível, marido de uma mulher, vigilante, sóbrio, honesto, hospitaleiro, apto para ensinar; não dado ao vinho, não espancador, não cobiçoso de torpe ganância, mas moderado, não contencioso, não avarento; que governe bem a sua própria casa, tendo seus filhos em sujeição, com toda a modéstia (Porque, se alguém não sabe governar a sua própria casa, terá cuidado da igreja de Deus?); não neófito, para que, ensoberbecendo-se, não caia na condenação do diabo. Convém também que tenha bom testemunho dos que estão de fora, para que não caia em afronta, e no laço do diabo. Da mesma sorte os diáconos sejam honestos, não de língua dobre, não dados a muito vinho, não cobiçosos de torpe ganância; guardando o mistério da fé numa consciência pura. E também estes sejam primeiro provados, depois sirvam, se forem irrepreensíveis. Da mesma sorte as esposas sejam honestas, não maldizentes, sóbrias e fiéis em tudo. Os diáconos sejam maridos de uma só mulher, e governem bem a seus filhos e suas próprias casas. Porque os que servirem bem como diáconos, adquirirão para si uma boa posição e muita confiança na fé que há em Cristo Jesus.” (1Tm 3.1-13).

“Por esta causa te deixei em Creta, para que pusesses em boa ordem as coisas que ainda restam, e de cidade em cidade estabelecesses presbíteros, como já te mandei: aquele que for irrepreensível, marido de uma mulher, que tenha filhos fiéis, que não possam ser acusados de dissolução nem são desobedientes. Porque convém que o bispo seja irrepreensível, como despenseiro da casa de Deus, não soberbo, nem iracundo, nem dado ao vinho, nem espancador, nem cobiçoso de torpe ganância; mas dado à hospitalidade, amigo do bem, moderado, justo, santo, temperante; retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes. Porque há muitos desordenados, faladores, vãos e enganadores, principalmente os da circuncisão, aos quais convém tapar a boca; homens que transtornam casas inteiras ensinando o que não convém, por torpe ganância. Um deles, seu próprio profeta, disse: Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos. Este testemunho é verdadeiro. Portanto, repreende-os severamente, para que sejam sãos na fé.” (Tt 5.13).

É fácil medirmos a importância da ética dentro do contexto do cristianismo de forma geral e dentro da liderança cristã de forma específica. Há algum tempo, um programa de TV de grande audiência mostrou a filmagem feita por um dono de padaria sobre um suposto pastor que lá entrava e roubava sempre alguns doces. Este é um fato corriqueiro que ocorre todos os dias. Mas, por se tratar de um líder cristão, virou notícia nacional.

Quando surge algum caso de adultério ou fraude com algum ministro evangélico é logo veiculado na imprensa, mesmo que a pessoa envolvida não seja muito conhecida. Dessa forma, percebemos as dimensões da cobrança com respeito ao comportamento dos ministros.

É bom lembrar que a cobrança não é primeiramente social, mas, sim, bíblica. Esta exige que o homem de Deus seja “irrepreensível”. A finalidade da Palavra de Deus é tornar “o homem de Deus perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra” (2Tm 3.17). A expressão “perfeito”, no sentido bíblico, não significa infalível ou sem pecado, embora este deva ser nosso alvo constante. Perfeito, significa completo, acabado, pronto para o propósito para o qual existe. Um Deus perfeito só pode desejar ministros perfeitos.

Todavia, bem sabemos que esta perfeição nem sempre está à mão. Sem querer nos apoiar em erros alheios para justificar os nossos, não podemos ignorar que o próprio Pedro, já como uma das colunas de Jerusalém, foi considerado repreensível por Paulo, devido à sua conduta diante dos cristãos judaicos: “E, chegando Pedro à Antioquia, lhe resisti na cara, porque era repreensível” (Gl 2.11). Por isso, temos de ser bastante cuidados neste ponto, não desejando ser excessivamente tolerantes, a ponto de permitir que desvios morais e éticos sérios venham ser acobertados, nem excessivamente julgadores, a ponto de transformar os líderes cristãos em alvo de padrões legalistas de conduta.

Outro fator que deve ser levado em consideração é que a Bíblia é explícita em mostrar um maior rigor no julgamento dos líderes (Tg 3.1). Isto é natural, uma vez que o líder é o representante, a síntese de um povo. É fato que muitos movimentos, mesmo eclesiásticos, ficaram ligados à pessoa de seus fundadores e líderes, como, por exemplo, os valdenses, os luteranos, os calvinistas, os wesleyanos, etc. Por isso, sua conduta deve estar acima dos demais.

Ao tomar uma posição de vanguarda, o líder fica exposto aos olhos, aos ouvidos e, principalmente, à língua de seus liderados e de outros. Embora seja agradável, isto é fato. Quem é alvo de atenção é alvo de crítica também. Quem tem suas virtudes conhecidas pelo público, também tem seus vícios sujeitos aos julgamentos dos outros. Não há como escapar.

Sabemos que muito da ética aqui expressa não é exclusiva aos ministros, mas está relacionada aos cristãos em geral. Todavia, os líderes são o “exemplo do rebanho” (1Pe 5.3) e seu comportamento determinará, no todo ou em parte, o comportamento de seus liderados. Além disso, o líder eclesiástico, como qualquer líder, representa a ideologia à qual pertence. Sua falha é a falha do grupo. Sua imagem é a imagem do grupo. Por isso, sua responsabilidade é maior. É curioso como no livro de Levítico a oferta pelo pecado do príncipe era igual à oferta pelo pecado da congregação toda (Lv 4.13-26). O peso era o mesmo.

Para amenizar um pouco esta intensa cobrança moral existente sobre o representante eclesiástico, cabe destacar que a cobrança, tanto do meio eclesiástico quanto de fora, costuma ser exagerada. Aquilo que poderia ser uma crítica construtiva acaba se tornando maledicência.

Ao invés de gerar um sentimento de busca por aperfeiçoamento no líder, gera uma gama de sentimentos nocivos. Um exemplo é a crítica a Moisés pelos seus irmãos (Nm 12.1-16). Um líder precisa de conselheiros e intercessores para se tornar melhor, não de críticos e acusadores.

Outro fator a ser considerado é o fato de a vida cristã ser um processo. Estamos sendo continuamente aperfeiçoados pela ação do Espírito, da Palavra de Deus e das circunstâncias (Sl 119.67; 1Co 3.18; 2Tm 3.14-17). O tempo é um fator a ser considerado na  vida do líder. Isto não é um “deixar para depois” que nunca chega, mas um reconhecimento de que falhas existentes hoje podem ser corrigidas amanhã. O caminho de um líder sofre um aperfeiçoamento, como disse Davi (Sl 18. 32).

É muito importante, e isto é um alerta a todos os líderes, que as exigências éticas não se tornem traumáticas para o líder e sua família. O que a Bíblia exige dos homens e mulheres de Deus é que sejam perfeitos e perfeitamente instruídos (2Tm 3.17), e ela não pode pedir menos, pois é a Palavra de Deus e Deus é perfeito. Não quer dizer que a perfeição é impossível, mas que é um padrão bastante elevado. E esta cobrança é, às vezes, lançada sobre o líder e sua família, em algumas ocasiões, de forma perversa. Ou seja, não é um desejo sincero pelo aperfeiçoamento, mas uma forma de acusação e exigência que está relacionada ao egoísmo. Qualquer falha é alvejada sem misericórdia. Tudo o que não for feito em amor não procede de Deus e as críticas, muito menos.