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Trindade: por que Deus precisa ser triúno?

Embora o vocábulo “Trindade” não conste na Bíblia Sagrada, seu uso é amplo no cristianismo e no ambiente teológico. A maioria avassaladora dos cristãos pensa – ainda que de forma assistemática – sobre a triunidade de Deus, fala e convive com ela, contudo, ainda são poucos os que buscaram informações sobre esta doutrina de forma que a possam concebê-la segura e profundamente. Este estudo pretende o aprofundamento na doutrina trinitária a fim de que possamos, mais do que conviver com as três pessoas divinas, edificarmos uma base de conhecimento que nos sustente ante as heresias e nos direcione em pesquisas futuras. Cabe ainda a observação de que esta análise não intenta (e nem achamos que poderia) ser exaustiva.

O que é a Trindade?

A Trindade ou triunidade pode ser definida como a doutrina que postula a unidade de Deus, mas nesta unidade, há co-existência de três pessoas iguais e co-eternas, que compartilham a mesma substância, mas em subsistências distintas. Esta definição é uma fórmula híbrida do Credo de Constantinopla, dos símbolos e confissões de fé da Reforma e de definições atuais de teólogos renomados, entre eles, Charles C. Ryrie.

A primeira pessoa a empregar o termo “Trindade” foi Tertuliano (160-220 d.C.). Ele, inclusive, foi o primeiro a fazer uso das palavras “pessoas” e “substância” para tentar definir a pluralidade de nosso Deus. Depois dele, Orígenes (185-245 d.C.) continuou o desenvolvimento da doutrina, ainda que equivocadamente, ao sugerir uma “infundada subordinação do Filho ao Pai” (Louis Berkhof), enfatizando, na relação entre as pessoas da Trindade, uma hierarquia de essência. Esta teologia abriu caminho para o futuro arianismo. Ário (250-336 d.C.) negava a divindade absoluta do Filho alegando que ele havia sido criado antes do tempo, sendo, assim, maior do que os homens mas menor do que Deus. Pouco mais tarde, o citado Concílio de Constantinopla (381 d.C.), que reafirmou as decisões de Niceia e condenou o arianismo como heresia, fundamentou a doutrina da Trindade de uma maneira que ampararia todas as formulações posteriores.

Este breve panorama histórico não faz jus à intensidade dos conflitos teológicos que foram travados para preservar os pilares do cristianismo. Todavia, ao analisar as Escrituras, que base temos para afirmar uma pluralidade em Deus? A Bíblia realmente nos mostra uma triplicidade no Ser Divino? De fato, é possível alegar tudo o que sabemos sobre a Trindade por meio de uma análise sistemática das Sagradas Escrituras. Ferramentas interpretativas como a hermenêutica e a exegese aliadas à adoção de uma estrutura lógica de pensamento, nos direciona, indubitavelmente, à Trindade de Deus.

A Trindade no Antigo Testamento

Na revelação veterotestamentária, Deus mostrou-se enfaticamente como uno, único, soberano, transcendente e imanente. Todos os crentes em Javé retratados nos escritos do Antigo Testamento (AT), invariavelmente, o tinham como uno (característica de ser indivisível, sem mistura de substâncias) e único (“de cuja espécie não existe outro”, segundo o Dicionário Aurélio). Essa convicção era muito importante para os descendentes de Jacó frente ao politeísmo predominante no Crescente Fértil dos tempos bíblicos, porquanto os “futuros israelitas” guardavam zelosamente em seus corações o monoteísmo transmitido a eles, inicialmente pela comunicação verbal inter-gerações e, futuramente, por Moisés.

Embora a crença num Deus único seja claramente evidenciada no AT, é possível afirmar que a Trindade está explícita em suas páginas? Em uma palavra: não. O leitor pode questionar este posicionamento alegando que, em diversos textos do AT, enxerga facilmente a Trindade. Contudo, só conseguimos enxergar a triunidade no AT porque já temos Deus como trino pelo conhecimento do Novo Testamento (NT). Em outras palavras, só conseguimos ver Deus como trino no AT porque o lemos com a ótica do NT. Portanto, ao termos a triunidade como pressuposto, tudo o que lermos sobre o Senhor no AT nos remeterá à sua existência trina. Entretanto, é válido dizer que o AT nos traz indicações da Trindade. Não são alegações explícitas desta doutrina, mas abrem caminho para a revelação neotestamentária de um Deus único, subsistente em três pessoas. As principais indicações da Santa Trindade no AT evidenciam-se na figura do Anjo do Senhor e em textos flexionados no plural, nos quais Deus refere-se a si mesmo. Outras possíveis indicações, como o nome Elohim, são mais vagas uma vez que este plural pode ser um hebraísmo que indica plenitude de poder e majestade, e não necessariamente uma pluralidade em Deus. No entanto, não julgamos prudente descartar esta possibilidade, de forma que Elohim, à luz do NT, pode indicar, além da plenitude de Deus, sua pluralidade.

O Anjo do Senhor é um personagem propenso a causar desconforto em quem nega a triunidade. Ele detém as prerrogativas divinas e algumas vezes é chamado de Deus, mesmo sendo distinto dele (Gn 16.7-13; 18.1-21; 19.1-28; Êx 3.2; Jz 2.1-4; 5.23; 2 Sm 24.16; Zc 1.12; Ml 3.1 e outros). Além disso, o fato de o Anjo do Senhor não mais aparecer depois da primeira vinda de Cristo, pode nos levar à conclusão de que ele próprio é a segunda pessoa da Trindade; suas aparições são frequentemente tidas como teofanias.

Não somente o Anjo do Senhor, mas alguns textos em sua forma plural nos permitem o assentimento de uma pluralidade em Deus, como já foi mencionado. Veem-se alguns exemplos destes textos em Gênesis 1.26; 3.22; 11.7 e Isaías 6.8. Em outros textos, vemos que o redentor, o Messias, era o próprio Deus, porém, separado dele (Sl 110.1,2; Is 59.20).

A Trindade no Novo Testamento

Na revelação neotestamentária, Deus aparece claramente existindo em três pessoas. A fórmula batismal e a bênção apostólica são exemplos de como o conceito trinitário de Deus estava arraigado nos apóstolos e cristãos do primeiro século. Ao mesmo tempo, o NT não abre mão do monoteísmo preconizado pelo AT.

Não obstante a unicidade de Deus ser real, o fato de o Senhor ter revelado a si mesmo como um Ser triuno fica evidente na realidade de que cada uma das três pessoas da Trindade, tanto o Pai, quanto o Filho, quanto o Espírito Santo, compartilham atributos exclusivos da deidade e são chamados de Deus (Jo 6.27; Hb 1.8; At 5.3,4). A fórmula batismal em Mateus 28.19 nos escancara a Trindade ao mencionar o Pai, o Filho e o Espírito num mesmo evento somando-se a isso o fato de as três pessoas estarem unidas num único nome. Apoiando o conceito de uma triunidade em Deus, Jesus, numa frase com forte valor teológico, se identifica com o Pai em essência (Jo 10.30), e o faz sem deixar espaço para o modalismo, conquanto não se ignore o contexto. O Espírito Santo, por sua vez, é chamado de Deus (At 5.3,4) e regenera as pessoas (Jo 3.5,6,8), obra que somente Deus tem poder para realizar.

Com efeito, a triunidade de Deus revelada no NT é nítida. As características divinas pertencentes a cada uma das três pessoas, seus nomes revelados a nós nas páginas dos livros inspirados, o fato de as três pessoas estarem ativamente envolvidas na obra de salvação, o vínculo entre elas com relação à criação (opera ad extra) e com relação ao seu próprio relacionamento interno (opera ad intra), além de declarações bíblicas explícitas, nos evidencia, indiscutivelmente, a doutrina da Trindade.

Por que Deus precisa ser triúno?

Alguns autores dizem que, hipoteticamente, se Deus não existisse em sua forma trinitária, ele sequer poderia existir. Concordamos com eles. A triplicidade em Deus garante sua imutabilidade ao impossibilitar na divindade um aperfeiçoamento progressivo. Este raciocínio baseia-se primeiramente no desenvolvimento da personalidade humana, que só é possível ser estabelecida por intermédio do contato com outra personalidade, necessariamente igual a ela, de outro ser da mesma espécie. Aplicando este raciocínio à divindade, se Deus, antes da criação, não tivesse se relacionado com outro ser igual a ele, ele não teria sua autoconsciência fixada. Acreditamos que, em certo nível (repetimos, em certo nível), pode-se estabelecer a personalidade humana como padrão pelo qual podemos entender a divina, admitindo que, como portadores da Imago Dei, o conceito que temos de personalidade sequer origina-se em nós, mas em Deus. As implicações da ausência de uma autoconsciência em Deus podem atingir patamares dramáticos ao imaginarmos que, se Deus não tivesse amado alguém antes da criação, ele só saberia o que é amar depois de ter criado alguma coisa e, desta forma, ele não seria perfeitamente imutável, já que teria aprendido algo. Ainda, se Deus não tivesse tido contato com outro ser exatamente igual a ele, ele jamais seria um Ser pessoal e autoconsciente. Agora, quem ele poderia ter amado antes da criação se nada existia a não ser ele próprio? Com quem o Senhor teria se relacionado antes da criação se não havia ninguém com quem ele pudesse se relacionar? A resposta a estas duas perguntas reside na existência trinitária de Deus.

Justamente por isso, o Senhor é o Deus que conhecemos. Ele sempre existiu em três pessoas e, por isso, sempre teve autoconsciência, pois sempre esteve em relacionamento interno. Desta forma, se Deus não fosse trino, ele não teria a natureza que revelou possuir, não teria os atributos que mostrou deter. Não haveria um Deus perfeito e imutável, logo, não poderia haver salvação. Conclui-se que o Senhor, tal como ele revelou a si mesmo, existe em uma triunidade.

Comentário

  • renato
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    Muito bom!

  • Vagner
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    Totalmente infundado, Deus é o próprio amor, ele não precisava de outra pessoa para saber o que é amar, ele é o próprio amor: 1joao 5:8 “Deus é amor”

  • Rone
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    Deus é Deus simplesmente porque é Deus! Ele não depende de experiências ou convivências para ser o que sempre foi, é e sempre será. Com todo respeito, mas Deus não precisa de nada, nem mesmo de ser dois, três ou quatro para ser Deus.

  • Pr.Vanderlei Tardelli
    Responder

    Deus é composto, pôr 3 pessoas distintas, quê compartilham dá mesma excência ou seja Deus -Pai -Filho e Espírito Sando. Sendo quê sou monoteíta e Creio num Deus composto por três pessoas, distintas. VANDERLEI C.C.TARDELI.

  • eloi Prado
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    Então, eu acho muito interessante sim este assunto, porém, sem fé é impossível agradar a Deus, sem o Filho é impossível conhecer o Pai, sequer sabemos orar mas o Espírito Santo intercede o Pai com gemidos inespremiveis. Uma coisa é certa Jesus Filho, único Senhor e Suficiente Salvador. e Aquele que Nele crer terão os seus sinais. Lembrem-se Não há resposta certa para Palavra de Deus. Devemos nos resguardar das heresias.

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